Cachalote: menos que uma baleia branca, mais que outra graphic novel
Quando a Cia. das Letras anunciou a criação do seu selo de quadrinhos não pude esconder o entusiasmo, mesmo já dispondo obras de peso na área, como as de Will Eisner e Art Spiegelman. O mesmo entusiasmo não diminuiu quando soube que um dos primeiros títulos nacionais do selo seria realizado por Daniel Galera e Rafael Coutinho com o também interessante título Cachalote – tal qual a espécie de Moby Dick, um dos livros preferidos do autor. E a obra surge num momento propício de popularização da 9ª arte, então nada melhor que um autor ascendente e pop como Galera para ajudar nessa tarefa. A graphic novel é composta de cinco histórias (ou seis, se consideramos o prólogo que da título à obra); histórias estas, sem título, com poucos diálogos, que não se entrecruzam, mas que dialogam entre si em função dos conflitos internos de seus protagonistas – homens, que dominam alguma arte: seja atuar ou dar exímios nós. Aliás, essa última arte, talvez pertença a melhor das histórias: a de um balconista de loja de ferragens que sai com mulheres que apreciam a técnica do bondage, mas que se apaixona por uma delas, perdendo o completo entusiasmo pela experiência sádica e por consequência aquilo que atraía nela. Destacam-se também a história do escultor recluso que aceita o convite para atuar numa filmagem que se assemelha a sua vida e a do ator chinês decadente, que promove ao mesmo tempo risos e melancolia durante a narrativa. A história do escritor em crise criativa e esquizofrênico é serena, com momentos de tensão e um final que não vale adiantar.
Com Cachalote, Daniel Galera nos mostra o quão interessante pode ser a sua obra – contista, romancista, tradutor, articulista de jogos, já teve histórias adaptadas para o cinema e o teatro e, agora, demonstra ser um bom argumentista de quadrinhos – mesmo com pouco texto, mas a leitura das imagens é Galera! Está a descrição acertada, os cortes a eloquência. A graphic reflete e nos (re)mostra um pouco do Daniel Galera do início de carreira, o autor de Dentes Guardados, algumas dessas histórias podiam configurar seguramente no pequeno e autoralíssimo livro de estreia, bem como alguns dos contos daquele seriam traduzido imageticamente com o traço correto de um Rafael Coutinho, responsável pela arte de Cachalote, cada vez mais seguro e original (como na sua participação na adaptação dos Contos de Grimm, da editora Desiderata) e que já avisou via twitter que a produção da animação Cachalote não tarda.
E assim, meu entusiasmo não diminui mesmo.
E assim, meu entusiasmo não diminui mesmo.
Publicado originalmente n'O BULE em 17/08/2010
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