O Cheiro Do Ralo
Era com ansiedade que esperava a estréia de O CHEIRO DO RALO, acho que devo admitir agora: gosto do contra-gosto. Daquilo que segue contra a corrente, da ovellha negra de cada arte. Seja na essência ou na proposta, ou só por não ser a mesmice reinante que nos rodeia; e O Cheiro do Ralo é um pouco disso. Fechado esse parentêses, voltemos ao filme. A ansiedade se dava pelo fato de ter perdido a uma pré-estréia no campus da UFRJ, há três ou quatro semanas do lançamento oficial; os burburinhos já rondavam o filme... cheguei no local atrasado e mesmo que estivesse lá em ponto, não assistiria - o espaço físico já estava tomado, enfim...
O filme é... ainda não sei o quê, mas você sai da sala de cinema com um sabor diferente nos lábios. O filme é sujo, os personagens são sujos, a (pouca) história é suja, Selton Mello/Lourenço é sujérrimo. É um filme bom? Pra mim é MUITO bom, mas qualificar assim é muito perigoso, não é mesmo? OCDR fala de dominador e dominados, fala de fetchie, questiona o que tem e o que não tem valor; fala mais um monte de coisas que ainda não sei como verbalizar - é um filme simples e complexo.
Você deve estar se perguntando, "e a trama?, e a história?" Quer saber? É bem simples: Selton Mello entrega o papel da sua vida com o personagem Lourenço, um corretor de velharias mesquinho que não tá nem aí para seus clientes, que paga o quer pelas "raridades" que esses desamparados vão vender. Até que um dia, dois fatos mudam, distorcem sua amarga rotina: o cheiro do ralo e uma bunda... isso mesmo, uma bunda; a da nova garçonete do pé sujo em que almoça todos os dias (e de fato, é uma bunda e tanto!); a partir daí, Lourenço revê sua vida e a sua posição nela, contando com a ajuda de outro objeto inusitado: um olho de vidro. Acho melhor parar por aqui e deixar vocês descobrirem (cheirarem) esse ralo.
Saí do cinema pensando no ralos, bundas revolucionárias, em Kafka, em Bukowski... (acho que viajei, mas como disse: é simples; é complexo) e, afinal, eu queria sentir que cheiro exalava daquele ralo! Como diz Lourenço com todo o cinismo contemporâneo :
"A vida é dura."
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